Se eu abrir uma escola especializada no ensino de Inglês, meus clientes provavelmente acreditarão que eu vá ensiná-los a falar, ler e escrever o idioma. Portanto, se eu não fizesse nada além de ensinar aos meus clientes uma série de frases de uso geral em Inglês, eles provavelmente ficariam insatisfeitos com meu trabalho e deixariam minha escola.

No entanto, todos os dias alunos estão aprendendo uma série de frases comumente usadas no Kenpo, e sendo promovidos de uma faixa para a outra, inconscientes de que eles nunca realmente aprenderam Kenpo. Na maioria dos casos, os próprios instrutores desconhecem o fato de que não estão realmente ensinando Kenpo, porque eles mesmos simplesmente ensinam o aprenderam – e da maneira como aprenderam.

Então, afinal o que é Kenpo? Durante anos pensei saber exatamente o que era Kenpo, até que um dia o Sr. Parker me disse que não queria me ensinar Técnicas ou Formas. Ele disse que qualquer um poderia me ensinar Técnicas e Formas; Ele queria me ensinar Kenpo. Honestamente, naquele momento eu fiquei completamente perdido. Eu passara anos aprendendo uma Técnica de Kenpo após outra e uma Forma de Kenpo após outra. Então, se eu não estava aprendendo Kenpo, que diabos eu estava aprendendo?

Olhando para trás, eu posso dizer exatamente o que eu estava fazendo. Eu estava memorizando o material que o Sr. Parker usou para ensinar Kenpo, mas eu realmente não estava aprendendo Kenpo. Vamos voltar para a comparação de aprender um idioma e como isso se compara a aprender Kenpo.

Todos nós conhecemos a analogia do Sr. Parker sobre como as Bases Kenpo são como palavras, as Técnicas são como frases, e as Formas são como parágrafos e histórias curtas, etc. Mas agora pense em uma frase simples, falada sem expressão. Uma frase monótona pode facilmente deixar de transmitir qualquer informação útil, mesmo que todas as palavras estejam presentes. Agora pense em ouvir um discurso inteiro ou, pior ainda, um livro inteiro de áudio lido por um leitor inexpressivo. Isto é aprender o Kenpo sem a aplicação de seus princípios.

Desde cedo, passei a ver o Kenpo de outra maneira; Especialmente depois que minhas Técnicas e Formas se tornaram muito rápidas e nítidas. Não somente quando meu kimono estava estalando e o suor voando. Devo dizer, para o observador inexperiente, eu era realmente impressionante. Só que eu não estava usando meus quadris, não ancorava corretamente, não controlava as ações do meu oponente, eu realmente não aplicava os princípios do Kenpo – ou talvez alguns poucos, mas somente por puro acidente.

A propósito, eu não estou falando apenas sobre os meus primeiros dois meses, ou mesmo os meus primeiros dois anos no Kenpo. Eu estou falando sobre algo como os meus primeiros oito anos. Foi somente quando eu comecei a estudar diretamente com o Sr. Parker que comecei a entender o que ele tinha ensinado e escrito por anos.

Você não domina a arte do Kenpo através da memorização do seu currículo, mas sim abraçando os princípios da arte. Peço desculpas se pareço estar batendo em cachorro morto, mas mesmo que todos os Kenpoistas  concordem comigo quando digo que nossa arte é baseada em princípios, quantas escolas realmente ensinam um currículo baseado em princípios?

Para entender completamente o que estou dizendo, pense no que foi “necessário” para você aprender a fim de obter a sua faixa amarela, laranja, etc. Se você é um instrutor, ou o proprietário da escola, pense no que você “exige” que seus alunos aprendam a fim de ganhar suas faixas.

Quase todos os nossos “requisitos” são expressos em Princípios, Técnicas, Formas e Conjuntos específicos. Para faixa amarela eu era obrigado a aprender a Base do Cavaleiro, Neutra, Arqueiro, etc. Eu era obrigado a aprender as Técnicas de Defesa Pessoal Delayed Sword, Aggressive Twins, e assim por diante. Meu requisito de kata era a Forma Curta I e meu conjunto obrigatório era o de Bloqueios.

Não que os princípios sejam deixados inteiramente de fora, eles são frequentemente mencionados, discutidos e até exigidos em alguns casos, mas o aprendizado dos princípios geralmente não é exigido da mesma forma que são as bases, técnicas, formas e conjuntos. Olhe na parede da maioria das escolas do Kenpo e o que você vê?

Geralmente, você vê os requisitos para cada nível de faixa, que novamente consistem em Bases, Técnicas, Formas e Conjuntos. Mas quantas vezes você vê uma lista de princípios necessários para cada nível de faixa? Como é que podemos dizer que ensinamos um sistema baseado em princípios, mas não conseguimos fornecer uma lista de princípios exigidos aos nossos alunos? Sim, os princípios estão listados na maioria dos manuais de faixa, mas em vez de terem um proeminente lugar próprio – mais merecedor de sua importância – eles são mais frequentemente apenas incluídos juntamente com o resto da “Terminologia”.

Isto é o que eu sugiro:

Separar os princípios do resto da terminologia, movendo-os para uma lista própria. Este procedimento sozinho pode estar em algum lugar entre o “um pouco complicado” e “muito controverso”. Por exemplo, um Desvio (parry) é um princípio ou simplesmente um termo? Ele é descrito como “o redirecionando um golpe conduzindo ou acompanhando a força”. Pode-se dizer que por estar “conduzindo” a força, é um princípio, mas na minha lista é simplesmente um termo que descreve uma ação; como bloquear, chutar e socar. Bloquear, chutar, socar e desviar são todas ações, executadas de maneira mais eficaz através do uso adequado de princípios, como Ancoragem, Torque, Condução, etc.

Para tornar o processo mais fácil, sugiro que você desenvolva sua lista de princípios em várias etapas. Primeiro, procure o termo “princípio” e dê uma boa olhada no que você está procurando. Princípio é descrito como: “Uma regra abrangente e fundamental decorrente de uma teoria que, através de análise devotada, desenvolveu as características comprovadas e fatos que fizeram doutrina”. Vamos refinar que um princípio é: “Uma regra abrangente e fundamental”. O fato de que ele surgiu de uma teoria e foi desenvolvido através de análise dedicada só sustenta como o que antes era apenas uma teoria tornou-se uma regra – ou princípio.

Com esta informação, torna-se muito mais fácil separar os termos como Desvio, Técnica, Forma, Conjunto, kata, Postura de Atenção, Base Neutra, etc., da nossa lista de princípios. Em seguida, separamos os princípios primários dos princípios secundários. Por exemplo, ninguém vai receber de mim uma faixa amarelo até que tenha uma compreensão básica de Economia de Movimento, Massa de Apoio, Torque, Casamento Gravitacional e Timing.

Por outro lado, eu não estou tão preocupado com o quão bem versado alguém está na diferença entre o Ângulo de Oportunidade e o Ângulo de Mobilidade. Não estou dizendo que esses princípios não são importantes. Estou apenas dizendo que vejo uma necessidade de priorizar tudo o que ensinamos, incluindo os princípios. E na minha opinião, saber a diferença entre Massa de Apoio e Torque é mais importante do que saber a diferença entre o Ângulo de Oportunidade e o Ângulo de Mobilidade.

Agora que separamos a terminologia geral dos princípios e separamos os princípios primários dos princípios secundários, vamos determinar quais princípios queremos exigir em cada nível de faixa. Observe que eu não disse que princípios queremos “ensinar”, mas quais princípios queremos “exigir” em cada faixa.

Desta forma não vamos limitar o número de princípios que um aluno pode ser exposto a qualquer nível de graduação, mas como nós também não queremos sobrecarregar um aluno com uma quantidade irreal de informação, devemos estabelecer um número finito de princípios que são “necessários” para conhecer, entender e aplicar em cada nível de faixa.

Abaixo está uma lista parcial de princípios divididos em vários níveis de faixa. Esta não é “a lista”, é apenas uma lista. Eu espero que sua lista e a minha sejam um pouco diferentes e possam mudar muitas vezes nos próximos anos.

À medida que todos nos familiarizarmos melhor com os princípios, é bem possível que o que consideramos mais importante hoje, possa ser diferente amanhã. Outra coisa que eu lembro do Sr. Parker compartilhar comigo foi que ele não gostava que as pessoas gravassem em pedra tudo o que ele dizia. Ed Parker continuamente revisou seus textos e ensinamentos em um esforço para transmitir melhor sua arte aos outros. Os princípios não mudaram, mas os métodos que ele usou para transmitir esses princípios foram continuamente refinados.

Faixa Amarela:

1.Back-Up Mass (Massa de Apoio)

2.Economy of Motion (Economia de Movimento)

3.Marriage of Gravity (Casamento com a Gravidade)

4.Torque

5.Tempo

Faixa Laranja:

1.Check (Conferir)

2.Contact Penetration (Penetração de Contato)

3.Frictional Pull (Puxar Friccionando)

4.Settling (Assentar)

5.Tailoring (Adaptar)

Faixa Roxa:

1.Borrowed Force (Força Emprestada)

2.Outer Rim (Borda Externa)

3.Outer Perimeter (Perímetro Exterior)

4.Delayed Movement (Movimento Atrasado)

5.Opposing Forces (Forças Opostas)

Faixa Azul:

1.Alignment (Alinhamento)

2.Bounce

3.Contact Manipulation (Manipulação de Contato)

4.Contouring (Contornando)

5.Geometric Path & Line (Linha & Caminho Geométricos)

Faixa Verde:

1.Anchor (Ancorar)

2.Compact Unit (Unidade Compacta)

3.Control Manipulation (Manipulação de Controle)

4.Rebounding (Ricochetear)

5.Critical Timing (Tempo Crítico)

Faixa Marrom:

1.Accumulated Force (Força Acumulada)

2.Fulcruming (Amparagem)

3.Continuity (Continuidade)

4.Directional Harmony (Harmonia Direcional)

5.Insert / Variable Expansion (Inserir/Variar Expansão)

Agora que você teve a oportunidade de ler minha lista, deixe-me reiterar: Esta não é uma lista completa; É apenas uma lista que nos dá um lugar para começar. Mas agora que temos uma lista, como vamos colocá-la para funcionar?

A enorme quantidade de conteúdo que temos no American Kenpo é bem conhecida e pode ser assustadora, para dizer o mínimo. Mas quando um aluno pergunta o que é exigido dele para ser um faixa preta, nós dizemos que ele deve saber as cento e cinquenta e quatro técnicas (juntamente com todas as Bases, Conjuntos, Formas e Freestyle Techniques).

No entanto, quantos faixas pretas esqueceram um grande número das mesmas técnicas que exigem de alguém para a fim de que ele também se torne um faixa preta? É claro, como faixas pretas, dizemos que embora tenhamos esquecido parte do material, ainda somos faixas pretas altamente qualificados. Na verdade em alguns casos, parece que a quantidade de material esquecido aumenta em proporção direta à sua graduação.

A propósito, este não é um artigo para atacar nosso sistema de graduação. Eu conheço grandes faixas pretas que não se lembram de todo o material que tiveram de memorizar, e isto não os diminui diante de meus olhos nem um um pouco. Eu, pessoalmente, não reivindico a capacidade de executar espontaneamente todas as técnicas do sistema, mas também não estou pronto para aposentar o meu status de faixa preta.

O que eu acho decepcionante, porém, é como muitos faixas pretas não sabem a diferença entre Borrowed Force (Força Emprestada) e Opposing Forces (Força Oposta).  O que parece faltar é o que o Sr. Parker sempre quis que as pessoas soubessem e que são os princípios do Kenpo. Novamente eu repito suas palavras, não minhas, “Eu ensino essas técnicas não para ensinar as técnicas, mas para ensinar os princípios que estão envolvidos nas técnicas.”

Proponho que consideremos a criação de uma lista de princípios que são necessários para cada nível de faixa e o coloquemos na parede do nosso Dojo. Então, quando alguém perguntar o que é exigido deles para um determinado nível de faixa, nós apontaremos – em primeiro lugar e acima de tudo – a lista de princípios. Então, quando eles perguntam qual é a outra lista, podemos dizer que é uma lista de técnicas de auto-defesa que usamos para ensinar quais são os princípios e como eles são aplicados.

Quando eles perguntam se eles são obrigados a memorizar todas as técnicas, podemos dizer: “Bem, não é tanto uma questão de ser necessário memorizar as técnicas. É mais o resultado final da utilização das técnicas para dominar os princípios que resultam na memorização das técnicas”. Então, podemos dizer-lhes que, com o passar do tempo, eles provavelmente esquecerão algumas das técnicas, e isso é bom, porque não estamos ensinando um sistema baseado na memorização, mas um sistema baseado na aplicação adequada dos princípios.

A primeira pergunta que recebo ao apresentar esta abordagem ao ensino do Kenpo é: “Mas muitos dos princípios que você listou para a faixa azul, verde e marrom devem ser aplicados às técnicas de faixa amarela, laranja e roxa”. Sim, concordo completamente. Nada diz que princípios adicionais não podem ser ensinados ao longo do caminho, mas eu não acho que faixas amarelas devem passar ou falhar em um exame com base em sua capacidade de aplicar Accumulated Force (Força Acumulada) e Directional Harmony (Harmonia Direcional).

Você pode olhar desta forma; É importante que os alunos de Kenpo estejam familiarizados com as técnicas contra dois atacantes, mas é importante que os estudantes da “faixa amarela” estejam familiarizados com as técnicas de dois atacantes? As Formas de Kenpo podem incluir projeções, mas as Formas de “faixa amarela” devem incluir projeções? Nós dividimos todos as nossas Bases, Técnicas, Conjuntos e Formas em níveis de faixa, então por também não dividir os princípios em níveis de faixa? Não nos impedirá de ensinar princípios adicionais, mas assegurará que ensinemos os princípios.

O objetivo deste artigo é alertar para a pouca atenção que muitos instrutores colocam nos princípios do Kenpo. Estou ciente de que o assunto pode ser um pouco controverso e iniciar algumas discussões. Se as discussões forem sobre quais princípios devem ser ensinados em quais níveis faixa, então este artigo realizou seu objetivo.

Escrito por Rich Hale (http://www.ohanakenpo.com) – Traduzido por Helio Greca

WhatsApp chat